COP 30: metas climáticas do Brasil impactam diretamente a Amazônia

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Esta reportagem faz parte da Série Especial "Empreendedorismo Sustentável - soluções e desafios para o futuro do planeta", da Rádio Cultura FM.
Foto: Fernando Sette / Agência Pará.

Os guardiões da floresta, oriundos das comunidades tradicionais que vivem dos recursos naturais, são as nossas principais referências de conexão com o ecossistema. Mas, infelizmente, muitos vivem em condições precárias, e uma das situações que acomete muitos destes povos tradicionais é a chuva e a falta de água. O cacique Pinawa Anambé faz um apelo à luta pela visibilidade e direitos dos indígenas, uma luta que visa preservar a cultura e as tradições.

“Recentemente, o nosso povo saiu do isolamento político. Hoje, nós estamos na participação na Semana dos Povos Indígenas para demonstrar que o povo Anambé ainda existe. Nós estamos nesse processo da retomada política e cultural das nossas tradições”

Quando há uma tempestade, as fossas transbordam, e quando o rio seca, eles ficam desprovidos de água. Este é exatamente o problema que o território indígena Tembé enfrenta, e um projeto da Universidade Federal Rural do Pará, a UFRA, veio para revolucionar esta situação e a de muitas outras comunidades amazônicas que padecem do mesmo problema. Os povos Tembé habitam principalmente o estado do Pará, com algumas comunidades no noroeste do Maranhão. A região do estuário do rio Guamá é parte do território indígena Alto Rio Guamá, onde vivem os Tembé, segundo a Fundação Carlos Chagas. O artesão Waldecir Tembé fala sobre aquilo que é a principal luta do seu povo.

“A nossa principal luta hoje é a defesa do território, que para nós é vida, é mãe, é tudo!”, ressalta.

As consequências das mudanças climáticas

Agora, você pode estar se perguntando qual a ligação desta situação e o efeito estufa.

A resposta é mais simples do que parece: este fenômeno é um processo natural que aquece o planeta e é agravado pelas atividades humanas, o que leva a mudanças climáticas que afetam o ciclo da água, e isso resulta em menos recursos hídricos disponíveis ou em chuvas mais intensas que causam inundações. Vânia Neu, professora e pesquisadora da UFRA, fala sobre o processo da criação deste projeto, que envolveu um longo processo de estudo.

“A ideia do projeto surgiu pela falta de dados que temos na região. Várias áreas da Amazônia são mais estudadas, por exemplo, a área central, em Manaus. Só que a Foz do Amazonas e o estuário do Rio Pará são locais pouco estudados devido à dificuldade de trabalho e logística. Um dos principais pontos a destacar é que este trabalho é o primeiro inventário de emissão de gases de efeito estufa na região, do que está sendo emitido pelos rios”, relata.

Muitos territórios indígenas vivem nesta realidade, de insegurança hídrica e alimentar. E para mudar este quadro, o estudo da UFRA mede a qualidade da água que as pessoas têm disponível e realiza um inventário de microplásticos no estuário do rio Pará. Este trabalho tem o principal intuito de ajudar a manter a floresta em pé, pois, na medida em que as pessoas não têm água e comida, elas saem dos territórios, e estes locais ficam vazios para os grileiros, que se aproveitam da posse ilegal de terras públicas ou privadas para obter lucro, ocuparem espaço e desmatarem o ecossistema.

Ao desmatar as florestas, o número de árvores diminui, e são elas as responsáveis pela evapotranspiração, fenômeno que joga umidade para a atmosfera e faz chover.

Portanto, os tempos nublados diminuem. Zelar pela preservação do meio ambiente também é zelar pela cultura e tradição dos povos indígenas, para que os conhecimentos ancestrais e o modo de vida singular destas pessoas não sejam apagados. Você vai entender melhor sobre a sabedoria que as comunidades tradicionais carregam na fala de Concita Sompré, presidente da Federação dos Povos Indígenas do Pará.

“Se você sentar-se próximo a um ancião indígena, sairá transformado com a sabedoria de vida que ele tem com o meio em que vive. Os povos indígenas não pensam só no ‘aqui’, mas para o além ‘daqui’. Todos estes conhecimentos ancestrais é que nós mantêm hoje, 524 anos depois, com a floresta intacta, vivendo numa economia sustentável e contribuindo para um país melhor, de uma forma que a comunidade não-indígena poderia estar se apropriando e se aliando a nós para um mundo melhor”, destaca.

Resistência e luta

No Pará, ao todo, são 77 territórios indígenas de 52 municípios.

Oitenta mil indígenas de 57 etnias ocupam 25% do território paraense, e todos eles pedem uma coisa em comum: paz. E isso só vem com respeito, com uma vida digna, onde eles possam continuar a desfrutar das florestas com toda a riqueza de recursos que elas podem oferecer. Uma das formas indicadas para resolver este problema é através de um dos compromissos mais ambiciosos do governo federal, que será apresentado na 30ª edição da Conferência das Partes, a COP-30: a redução de emissões de gases de efeito estufa em mais de 50% até 2030, um equivalente a 1,2 gigatoneladas dessas substâncias. Trata-se da nova meta brasileira com relação ao Acordo de Paris, tratado internacional sobre mudanças climáticas, adotado em 2015 e em vigor desde 2016, que visa limitar o aumento da temperatura global a 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais. Esta é a chamada Contribuição Nacionalmente Determinada, ou NDC, que são os compromissos que cada país signatário deste acordo estabelece para enfrentar as mudanças climáticas.

Soluções e desafios

Este passo é muito importante, tendo em vista que o último balanço do Acordo de Paris, em 2023, mostrou que o mundo está fora da rota para conter o aquecimento médio do planeta a 1,5 grau. Cláudio Angelo, coordenador de comunicação do Observatório do Clima, fala sobre os caminhos que o Brasil deve trilhar para alcançar esta meta.

“Pra alcançar a meta, o Brasil deveria zerar o desmatamento, principalmente na Amazônia e no Cerrado. Este fenômeno é responsável por quase 50% das emissões de gases de efeito estufa no país. Trata-se de um dever não apenas ambiental e econômico, mas também moral. É uma coisa que já não deveria acontecer há muito tempo porque temos terras abertas em área mais do que suficiente para expandir muito a produção agropecuária do país sem precisar cortar mais uma árvore sequer”.

Preservar o ecossistema significa zelar pelo nosso patrimônio natural, é honrar as raízes das comunidades que vivem da floresta e garantir que as próximas gerações herdem não só recursos, mas também sabedoria, cultura e vida. Pora Borari, cacique da Terra Indígena Amaró, faz um desabafo sobre as necessidades do seu povo.

“Bom, espero que consigamos ser vistos como parte da sociedade. Historicamente, somos vistos como seres à parte da sociedade brasileira. Só somos bem-vindos quando estamos no ritual dançando e cantando, mas quando passamos a reinvidicar políticas públicas, isso se torna um problema para o estado. E nós não queremos ser um problema. Nós somos a solução para mudanças climáticas, bioeconomia, sustentabilidade, porque nós protegemos 80% da biodiversidade do planeta”.

Confira o 5º Episódio da "Série Empreendedorismo Sustentável - soluções e desafios para o futuro do planeta", da Rádio Cultura (93,7 FM)